March 30, 2014

Tokyo Fashion Festa São Paulo - Palestra

A primeira impressão do local onde aconteceu o evento para alguém que não conhecia é ótima: a faculdade Santa Marcelina, apesar de não ter uma localização de acesso facilitado, tem a estrutura e os recursos ideais. A qualidade e a seriedade como foi tratado o assunto, assim como a Fundação Japão sempre faz, passa uma credibilidade enorme e somou um ponto positivo pro j-fashion no país. A colaboração entre as duas instituições deu resultados: as inscrições esgotaram e a fila para entrada chegou a atrasar o início das apresentações.


A palestra de Nichi Kashihara começou com uma introdução sobre o seu trabalho que está sempre envolvido de alguma forma com a divulgação da moda japonesa no exterior, seja através de sua loja em New York, Madame Killer, seja em suas viagens à diferentes países ministrando sobre o assunto.

Para um entendimento do que acontece hoje, ele ilustra o contexto histórico partindo dos anos 80, época que se tem início o street style como conhecemos hoje, e dá continuidade explicando resumidamente a situação econômica do Japão, a mudança do perfil de quem consumia moda (antes liderada pelas "OL" ou "office ladys" e depois passada para meninas mais jovens, as colegiais), até chegar nos estilos que conhecemos hoje. Os seguintes foram mencionados: gyaru (gyaruo, yamamba, kogyaru, onee gyaru), lolita (sweet, gothic, classical, wa, punk), mori-kei e aomoji-kei.


A ênfase da palestra, apesar de ainda sucinta, foi nos mais populares: gyaru e lolita - enriquecida pela nossa embaixadora kawaii Akemi Matsuda, que forneceu uma entrevista para esclarecimentos sobre a cena no Brasil. Falou das dificuldades que enfrentamos por ser um país tropical, os preços altos de importar roupas de marca japonesa (acho que ela assustou muita gente dizendo que vestidos poderiam custar US$1000 haha), as alternativas para isso, os meetings que precisam de lugares muito específicos... Mas que mesmo assim cada vez mais ela vê que a quantidade de pessoas interessadas cresce, e que pôde constatar nas viagens que fez por todo o país que devem haver cerca de 5000 lolitas (e simpatizantes? :x - minhas palavras essas) hoje. 

Um dos termos apresentados mais interessantes para mim foi o "dokumo" ou leitores-modelo, que é uma grande peculiaridade da moda japonesa (porém não uma novidade, tem um episódio inteiro do kawaii international a respeito). São aquelas pessoas que conquistam fama saindo nos street snaps ou pelos seus blogs, e acabam virando modelos para aquela revista que antes eram apenas leitores (ex. Misako Aoki, Tsubasa e Kyary). Ele fala da importância desses profissionais para as revistas e que representa uma forte tendência, já que eles conhecem de forma mais íntima o público-alvo, seus gostos e hábitos. Muitas vezes esses modelos tem uma liberdade maior de publicar o seu estilo particular: é um estreitamento bem mais óbvio entre o street fashion e a moda que a mídia oferece. 


Acredito que tenha sido uma aula sobre moda urbana japonesa válida para aqueles que não estão familiarizados, que é, afinal, a maioria no Brasil. Mas ao mesmo tempo, sinto que em uma rara oportunidade onde temos um palestrante do Japão, seria mais enaltecedor uma abordagem mais sociológica, psicológica ou pelo menos que demonstrasse a a perspectiva pessoal de alguém que morou e cresceu naquela cultura, testemunha das relações diárias que eles tem com a moda, seus reflexos nos outros países... em oposição a repetir a mesma ponta do iceberg que podemos ver na internet. Não presenciei a primeira palestra do Tokyo Fashion Festa em 2011 (vi apenas o desfile no Festival do Japão), logo não tenho como comparar as duas, mas pelo que li as duas tiveram diferenças mínimas, até mesmo na seleção das fotos... Para o público que foi apresentado, em uma faculdade de MODA, gostaria que tivessem dado a ele (ou que o próprio tivesse se permitido) a liberdade de dar um passo à frente.

Kashihara parecia estar surpreso de ver que boa parte das pessoas presentes já conheciam os termos e sabiam quem era Namie Amuro, o que só confirma o que ele próprio está defendendo. Imagino que cada vez mais esteja ficando claro que a moda japonesa não é mais um elemento à parte do mundo, ela está influente em todos os lugares e pode estar maior do que podemos estar nos dando conta: os indícios dessa palestra levam a crer que Misako Aoki estava certa em dizer que o maior potencial de crescimento de lolita está no exterior, e que isso vale também para outros estilos que, mesmo que percam sua força no país de origem, poderão ser acolhidos com grande entusiasmo por outros.

Lost in translation - Alguns termos específicos sempre acabam dando aquela escapulida na tradução simultânea (portanto literal), por isso inferi que por "lolitas naturais" ele estivesse se referindo ao classical lolita, por "estilo fancy" (o da kyary) ao aomoji-kei e por "mori gyaru" ao mori girl/mori-kei, e não à vertente de gyaru. Mesmo que eu não tenha certeza se os nomes que os japoneses usam para classificação são os mesmos que os da internet, espero que isso não tenha causado muita confusão nas pessoas que não conheciam os estilos.


No próximo post: o desfile.


14 comments:

  1. Muito bem escrita essa postagem, Rika! Estou gostando dessa nova forma que você está dispondo as imagens também! Acho que consegui ter uma ideia bem precisa do evento, mesmo à distância, o que penso que é muito positivo!!!

    Concordo muito com você quando diz que a palestra poderia ter aprofundado mais! Fica muito mais interessante para quem já tem certa noção do que está sendo abordado (ainda mais que não é a primeira edição do evento) e, os que são novos, podem muito bem partir para a internet depois, que, convenhamos, está cheia de bons materiais e já não se precisa mais acessar blogs gringos!

    Adoraria ter participado do evento e aguardarei pelo segundo post!!!

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    1. muito obrigada, sayaka! se a maioria das pessoas que lerem tiverem essa mesma impressão, sinto que minha missão com o post foi bem sucedida! é exatamente isso que almejei: dar uma boa idéia de como foi pra quem não pôde estar lá.
      e fico feliz que tenha notado a respeito das imagens também. :))

      pois então, achei que foi um pouco de desperdício passar boa parte da palestra na definição e história de lolita e gyaru... se fosse em outras circunstâncias além de uma faculdade de moda, minha opinião seria diferente, é claro. ninguém tem obrigação de saber o que são esses estilos tão diferentes, que vêm de um lugar tão longe.

      não demorarei para postar. :)

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  2. Concordo com o que você disse, Rika, principalmente no que diz respeito aos assuntos abordados.
    Como estudante de moda na própria FASM, eu realmente esperava que a palestra fosse mais voltada para indústria, mercado e criação de moda, ou até mesmo um pouco mais sobre a origem e motivo de haverem tantos estilos alternativos e diferentes no Japão.
    E adorei te conhecer pessoalmente, mesmo que tenha sido breve :D

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    1. não é? foi o que comentamos lá, à jato. heh e foi uma honra pra mim te encontrar pessoalmente, não esperava!

      nossa, seria fascinante ouvir sobre essas questões com mais aprofundamente que você citou. até porque... mesmo que tendências hoje estejam muito mais sincronizadas globalmente, existem outros aspectos na moda que levam mais tempo pra "pegar" por causa das diferenças culturais, econômicas etc. ...ou que nem chegam. esse é um dos motivos do conceito de dokumo me despertar mais curiosidade, de eu achar que é mais relevante.

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  3. Nossa, seu post foi muito bem escrito, Rika! Estou até com um pé atrás agora pra postar no meu blog hhsuahusahu

    Quando eu fui na palestra, esperava que ele fosse falar mais sobre a moda "casual", já que as marcas apresentadas não se encaixam totalmente na moda alternativa que vemos em Harajuku; e pessoalmente eu fiquei surpresa por ele citar o Mori Girl, porque eu não achava que a proporção que esse estilo teve foi grande o bastante para ser apresentado na palestra!

    De qualquer forma, foi uma ótima experiência. Fiquei muito feliz em ter te conhecido pessoalmente, se tivesse acabado mais cedo eu teria te puxado para um canto e pedido uma entrevista xD

    Esperarei pelo próximo post~

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    1. haha imagina, seu post ficou muito bom! eu é que estou com o pé atrás da minha foto que você tirou naquela luz ingrata!

      apesar de continuar sendo "made in japan", os estilos que foram discutidos e os que foram mostrados não coincidiram, né? mas eu acho que isso mostra o quão variada e ampla é a moda japonesa. e pra mim com exceção da ono, as outras todas são bem alternativas sim... difícil de imaginar qualquer outro lugar no mundo que abrace fácil a idéia de usar roupas inspiradas em luta livre. haha

      o mori apesar de não ser tão estabelecido como estilo e com uma comunidade maior formada, ainda tem características bem fortes, acho que é por isso que ele se destaca mais do que o dolly-kei, cult party, fairy-kei... que acabam se mesclando no aomoji também. D:

      indeed! foi um prazer conhecê-la! e nossa, quem sou eu pra ficar dando entrevista por aí? haha

      nesse mesmo bat-canal! 8D

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  4. Realmente a palestra é mais válida para quem não conhece moda urbana japonesa.
    Tive a oportunidade de visitar uma exposição (com os looks desfilados no Festival do Japão) seguida de palestra, no Senac. Na época ele mencionou estar um pouco desatualizada, mas assisti o final dessa e parece ter mudado nada. Só acrescentou a parte da Kyary mesmo.
    Seria interessante ele ter falado mais da experiência dele de mercado e a visão dele, como você bem mencionou.
    Uma das partes bem positivas foi ele mostrar que existe uma comunidade lolita no Brasil.

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    1. ahá! uma pessoa para confirmar minhas suspeitas.

      verdade. apesar da gente saber muito bem por estar no meio, a entrevista com a akemi sobre lolita deve ter dado outra perspectiva pra quem vê de fora, incluindo o próprio kashihara.
      também tenho curiosidade de saber se ele notou alguma diferença entre 2011 e 2014 em como os brasileiros lidam com o j-fashion.

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    2. Realmente ele deve ter ficado surpreso, da outra vez acho que pensou que não tinha muito público aqui no Brasil. Acho que fui a única que falou que tinha lolitas no Brasil, daquela vez. O pessoal havia levado ele para conhecer a Liberdade pouco antes, tentando mostrar a moda jovem no Brasil - ele parecia meio descrente. rsrsrs
      Ainda bem que ele convidou a Akemi, realmente deve ter surpreendido positivamente. n_n

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    3. jura? minha nossa! haha se bem que na liberdade é só de final de semana que tem mais gente usando algum estilo que remete à moda japonesa, espero que tenham ido ao menos em um dia desses...
      então devemos à você também por avisá-lo! :)

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  5. Muito bacana essa postagem. Como alguém que estava lá assistindo a palestra, eu também me confundi com alguns termos traduzidos, e estou nessa dúvida até agora, mas foi bom você tentar esclarecer isso.
    Quanto ao conteúdo, também acho que deveriam mudar um pouco a vertente, mas também tenho minhas dúvidas se tanta gente assim conhece a moda do Japão. Pode ser que por se tratar de estudantes de moda a maioria saiba por isso, mas quando se trata de um público mais amplo, talvez não.
    Posso estar falando groselha então me desculpe!
    Parabéns pelo post ^^

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    1. nossa, pois então, se confundiu você que conhece lolita, imagine as outras pessoas! espero que realmente seja útil. :)

      e imagina, camila, você tem razão de dizer que se for um público mais amplo, é preciso que se passem esses tipos de informações!

      muito obrigada mesmo!

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  6. Parabéns pelo Post Rika!
    Eu particularmente sou nova no meio Lolita, e eu acho muito interessante ver que tem essas iniciativas para divulgar a moda japonesa em diversas partes do mundo.
    Eu concordo com a Akeme com relação a importação ser cara, e as condições climáticas.. Fico feliz em saber que a moda está crescendo! Seria lindo ver várias Lolitas andando na rua ^-^
    Obrigada pela Resenha, foi muito interessante! Parabéns!


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    1. seria lindo mesmo ver estilos diferentes andando livremente por aí! no brasil infelizmente acho que estamos muito longe disso e por razões menos contornáveis que a acessibilidade à marcas japonesas ou o clima, mas todo o incentivo é válido, senão necessário!
      que bom, muito obrigada mesmo, aninha! :)

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